Rubem Alves, Educador.
Esse é um texto sobre um dos mais respeitáveis, admiráveis e esquecidos educadores do Brasil.

Rubem Alves é um ilha de sobriedade e essa é uma de suas grande entrevistas, conduzida magistralmente por Antônio Abujamra, igualmente genial e esquecido.

Ambos, infelizmente, não estão mais por aqui, mas esse registro eterniza uma discussão sempre relevante e atual sobre educação, sobre educadores, sobre a escola e, sim, sobre a vida e seus valores universais.
A entrevista é de 2011 e foi originalmente veiculada no programa Provocações da TV Cultura.

Abaixo comentamos alguns trechos e localizamos pra você onde essa discussão acontece no vídeo:
Entre 00m:00s e 01m:00s
Abujamra tradicionalmente inicia seus programas com um monólogo filosófico, idolatrando a dúvida, o que é intrigante para tempos onde todos manifestam irredutível certeza sobre todas as coisas.
Na sequência, uma frase centenária de Rui Barbosa mostra-se inacreditavelmente atual:
“Educação popular é a mais fecunda de todas as medidas financeiras”
Entre 01m:00s e 03m:30s
Ambos discorrem sobre a capacidade que temos de continuar nutrindo dúvidas e fazendo perguntas, tipicamente como fazemos quando crianças.
O ato socrático, de aprender pelo questionamento é, hoje, uma das habilidades mais importantes para a criação do pensamento crítico.
Entre 03m:30s e 06m:00s
O poder do educador reside em saber comunicar idéias, usar do poder de síntese, trabalhar com metáforas e analogias.
Essa capacidade é essencial para aproximar os alunos de discussões densas e profundas, criando a fagulha necessária para que cada um seja capaz de conduzir seu próprio aprendizado e se interessar, cada um do seu jeito e no seu tempo, pelos conteúdos mais clássicos.
Entre 06m:00s e 07m:30s
O mau uso do tempo é combatido nesse lindo trecho.
Buscamos ganhar tempo utilizando atalhos que matam a experiência e o sentido das coisas.
Uma critica certeira na sociedade imediatista, que anseia por respostas definitivas em pílulas mágicas.
A questão é sobre como gastar (qualitativamente) o tempo.
Concordamos.
Entre 10m:00s e 11m:00s
Uma reflexão essencial para momentos de quarentena, sobre ter a sensibilidade de reconhecer que as coisas essenciais da vida apenas são encontradas se estivermos dispostos a prestar atenção nas miudezas.
A reclusão, a restrição, a limitação — tudo isso pode ser reenquadrado e ganhar novos significados. Não é autoajuda, é lógica com sensibilidade.
Entre 15m:00s e 16m:00s
Outra reflexão sobre como lidar com momentos adversos, sobre ter uma perspectiva antifrágil da vida, ou seja, sobre ser flexível o suficiente para permanecer jogando quando esse momento passar.
É resiliência aplicada na prática, mas com a clareza de entender o que é ser resiliente e o que é apenas ser teimoso,
Entre 17m:20s e 19m:00s
A conversa opõe otimismo e esperança sobre a possibilidade da educação brasileira mudar.
Esse é um momento de oposição de ideias entre Abujamra e Alves, mas que convergem para um ponto em comum.
Não é e nunca vai ser uma questão (apenas) de estado ou de política pública.
É, antes de tudo sobre o sentimento e a inteligência dos professores para entender o seu papel.
Segundo Alves, esse é o ponto central, capaz de mudar realmente o cenário educacional no país, afinal educar é muito mais que dar aula, muito mais profundo que isso.
Entre 21m:40s e 23m:30s
O ponto mais contundente.
Os efeitos nocivos do conceito restritivo das grades curriculares, o aprisionamento dos alunos numa linha industrial e mecânica de ensino.
A necessidade implícita de “ter que dar o programa” e a falta de questionamento dos professores. Um binômio cruel.
Grades aprisionam, não são fluídas, não são orgânicas.
Um modelo antinatural, ultrapassado de pensar e fazer educação
Entre 23m:30s e 29m:00s
Não existe ensino, o que existe é a aprendizagem.
O impulso da aprendizagem é o impulso de viver.
É preciso sair dos limites da escola e transformar a própria casa em laboratório.
Alves cita o caso de uma escola nas Ilhas Faroe, perto da Escócia, onde as crianças aprendem sobre todas as coisas compreendendo a estrutura e o funcionamento de uma uma casa viking.
E aí, como usar sua casa como uma escola na sua quarentena? Alves dá um exemplo delicioso na entrevista, usando o cocô.
Sim, é delicioso o exemplo, mesmo com cocô.
Entre 29m:00s e 32m:00s
Uma escola sem salas de aula, separação de alunos, sem um programa a cumprir.
Alves e Abujamra conversam sobre o caso da Escola da Ponte, em Portugal.
Quando na escola, Alves foi guiado por uma garotinha que, da grandeza de seus 6 anos, disse que : “se o senhor quer entender nossa escola, vai ter que esquecer tudo que sabe sobre escolas”.
De arrepiar.
E ela disse mais: “Não temos aulas, não temos campainhas separando o tempo, não temos notas”, ao que Alves retrucou: “Mas como vcs aprendem?”
E aqui a garotinha sintetiza o coração da cultura ágil:
“Formamos pequenos grupos de até 6 pessoas em torno de um tema de interesse comum. O professor é apenas um assessor — apenas para dicas de internet e bibliográficas. Montamos um programa de duas semanas. E depois desse tempo, voltamos e discutimos o que aprendemos”
A escola da ponte é o ágil, na realidade.
A escola foi perseguida. A sociedade pediu o fechamento. O governo foi analisar para compreender como estavam aqueles que passaram pelo sistema.
E descobriu que os que haviam passado por lá eram os mais brilhantes.
De arrepiar.
Entre 33m:00s e 36m:30s
Ambos discutem sobre inclusão e sobre o fato de que, como os currículos das escolas tradicionais se assemelham a linhas de montagem, isso afasta as pessoas com deficiência.
Quem não tem a mesma capacidade, não consegue seguir o programa, não consegue correr essa mesma corrida.
Isso é diferente na Escola da Ponte, onde todos seguem nos seus ritmos, como podem.
Quando perguntado, como as PCDs eram incluídas, o Diretor da Escola da Ponte disse.
“Leia Alice no País das Maravilhas. Alice caiu no buraco de um coelho. Encontrou uma turminha de varias bichos. O pássaro Dodo organizou uma corrida em torno da terra. Cada um corria de um jeito. Eis que o pássaro diz: acabou a corrida. E perguntaram: Quem ganhou. Todos ganharam e todos receberão suas premiações”
Essa é a tônica da inclusão. Todos ganham. Todos chegam.
Usando o próprio Alves contra ele mesmo, o Diretor da Escola da Ponte simplificou um assunto complexo com uma linda metáfora.
Educar é sobre comunicar idéias, não?
Entre 39m:00s e 40m:30s
Uma pérola de pensamento lógico.
Sobre Deus, as genitálias e o fundamento adjacente da coisa toda — o sexo.
Outra boa reflexão para a quarentena.
Apreciem Alves, apreciem Abujamra.
A educação agradece.
#curadeconteúdo